Reforma ou simples meia-sola eleitoral?

por Gilberto Caruso Ramos - economista, foi Vice-Prefeito do Rio.

Que o sistema político-eleitoral precisa ser repensado tudo mundo sabe; que a representação política é a essência da democracia ninguém duvida; mas daí a pensar que a reforma eleitoral possa se ater apenas às questões formais, como fidelidade partidária ou voto facultativo, é um grande erro.

Era comum que os vereadores de Fortaleza pedissem licença para que seus suplentes assumissem. A Lei Orgânica de lá previa que o vereador que ocupasse o mandato - e não dizia em que condições - receberia os salários, integralmente, pelo resto da vida. Corria o boato de que eram comuns os negócios por debaixo do pano entre titulares e suplentes para divisão do butim. Mas como a imprensa denunciou a maracutaia, o edis resolveram dar uma guaribada na Lei Orgânica e adjetivaram-na acrescentando a expressão "mandato efetivo". Mas é a velha e revelha história: a cada lei corresponde sua fraude.

Em 30 de dezembro de 92, portanto, no último dia da legislatura, um vereador renunciou e seu suplente assumiu "efetivamente" o mandato durante somente um dia. Pois 24 horas depois estava com salários integrais garantidos até a morte e, pasmem, seus pensionistas também podiam pegar uma carona. Bem que o Prefeito que se empossou em 1/1/93 - Antonio Cambraia, um homem de bem - tentou enfrentar esta pilantragem. Recorreu à Justica e perdeu. O argumento prevalecente era de que a lei estava correta e não cabia à Justiça dizer se ela era justa ou não. Barbaridades como essa acontecem pelo Brasil afora e o povão nem fica sabendo.

Agora mesmo os Vereadores do Recife se autoconcederam um aumento de 144%. O expediente utilizado foi através da verba de representação e, sendo assim, eles receberão mais de R$ 14.000,00/mês. Mas isso é café pequeno se considerarmos que senadores que se acusam mutuamente conseguiram amealhar fortunas de mais de U$ 30 milhões, e sem jamais terem trabalhado fora do setor público. Rui Barbosa bem tinha razão quando falava do "estado multimâmio". Haja tetas e úberes.

Sempre defendí que deveríamos abolir os cargos de "vice" em qualquer nível. Só de Vice-Prefeitos são mais de 5.500. Nesse mundo da informática, com os controles e comandos cada vez mais virtuais, poderíamos economizar, por baixo, uns U$ 500 milhões anuais com a supressão destes cargos rigorosamente inúteis. Sem contar os respectivos assessores - os "aspones" - os carros chapas brancas, as secretárias sedutoras, os telefones vermelhos, a postagem gratuita, e outras mordomias menos valorizadas.

Fico animado quando ouço algumas vozes se levantarem no Congresso tentando corrigir esta orgia de gastos. O Sen. Maguito Vilela (PMDB-GO), p.e., quer reduzir o mandato dos senadores para quatro anos. Certíssimo, por que mandato de oito anos ? O Sen. Paulo Hartung quer substituir o atual sistema de vereança por Vereadores Honorários, não remunerados, além de reduzir a própria quantidade de vereadores. Excelente idéia.

Ainda agora o Min. do STJ - Edson Vidigal - com sua experiência de ex-parlamentar, e reconhecidamente um homem de bem, propõe a redução drástica do número de deputados federais, e redução de um terço no número de senadores. Sugere ainda a extinção das Assembléias Legislativas que só se reuniriam para aprovação e fiscalização do orçamento já que, para isso, temos os Tribunais de Contas.

O Vice-Presidente Marco Maciel tem viajado e pregado a urgência da reforma político-eleitoral. Mas deve aproveitar o tempo e as mordomias disponíveis como Vice para pregar as modificações que, de fato, implodam o corporativismo da classe política. E, por favor, vamos combater esta infeliz idéia do financiamento público das campanhas eleitorais. Ou será que o dinheiro público inibirá o caixa 2 que aduba as campanhas dos políticos caras de pau e que sujam as cidades ? Recentemente O GLOBO mostrou que os candidatos que disputaram o 2º turno do Rio receberam, simultâneamente, ajuda financeira de uma mesma empresa. Mas quando uma mesma empresa doa dinheiro para dois adversários é ajuda ? e se não fôr, é investimento ? e se não fôr qualquer das hipóteses anteriores ? seria suborno ? Dinheiro público metido nisto é que não dá.