O noticiário econômico enfatiza as nuvens negras que rondam a economia brasileira. Apontando para causas as mais criativas, desde a conjuntura mundial, passando pelas eleições de outubro próximo, resvalam até para o clima de insegurança que se estabeleceu no eixo Rio - São Paulo. O candidato Lula passou a ser visto como o capeta que ameaça os mercados e põe em risco o futuro brasileiro, e até o abominável Elias Maluco já foi citado como causador da deseconomia, afugentador de executivos recheados de dólares que, por medo da violência urbana, aplicariam em outros mercados mais calmos.
A verdade é que o Brasil, embora tenha uma equipe econômica de respeito, está caminhando no fio da navalha há muito tempo. Esse papo de que os fundamentos da economia brasileira são sólidos, esbarra na contradição de juros altíssimos e tributação escorchante. Ainda agora o governo não conseguiu colocar boa parte dos títulos públicos com cláusula cambial que leiloou. Enquanto isso o Pres. FHC, em discurso bombástico, diz que não temos alternativa: é exportar ou morrer. Mas como exportar se a tributação é crescente ? A luta do governo para restabelecer a CPMF, um tributo de incidência inexorável em toda cadeia produtiva, é uma boa prova dos paradoxos governamentais.
É muito mais fácil iludir os palpiteiros da economia doméstica do que os experts estrangeiros que raciocinam com a lupa nas estatísticas. Temos uma relação de 4/1 entre dívida externa e exportações, uma barbaridade de comprometimento. Nossa pobre vizinha Argentina está com 5/1 e, se não tomarmos cuidado, brevemente lhe faremos companhia no clube dos devedores. O Chile, mais prudente, conseguiu reduzir para 2/1. Com esta relação mais favorável fica viável seduzir bancos e captar investimentos internacionais.
Durante os últimos anos oitenta o saldo positivo da balança comercial equivalia ao pagamento do serviço da dívida. Agora, como nossas exportações estão tímidas, a solução é pagar os credores com poupança importada dos próprios credores. O dinheiro que vem de fora, entra por um bolso e sai pelo outro. É o caso do FMI que nos emprestará mais U$ 10 bi e, ato contínuo, baterá na porta para receber de volta a dinheirama. Estão certíssimos, afinal quem deve tem que pagar. Não vamos escapar de um reescalonamento da dívida externa que englobe prazo e custo, antecipemo-nos. Nas condições atuais, nossa " dead line" o final de 2003.
O governo, ao relacionar dívida com PIB, está tapando o sol com a peneira. È o caso quando diz que devemos 54% do PIB, enquanto a Bélgica deve 110%. Acontece que é preciso olhar o perfil da dívida no tempo e na origem, e aí vamos perceber que o torniquete está apertando. Grande parte da dívida brasileira interna é governamental (44% do PIB). Pior, com US$ 30 bi indexados em dólar e vencendo este ano. Resultado: quando os juros sobem a dívida acompanha, quando o dólar sobe também.
Nossa economia está parada. Um crescimento de apenas 2% do PIB em 2002 será insuficiente para as necessidades de investimentos e geração de emprego. O desejável seria 4% por cinco anos consecutivos. Como estamos exportando somente 10% do PIB, ficamos sem margem de manobra. Enquanto isso, os tigres asiáticos - Coréia do Sul, Singapura e Hong Kong estão exportando 40%, fruto da produção eficiente e agressividade comercial que demonstram. Malásia, Filipinas e Indonésia também vão de vento em pôpa, sem falar de Taiwan e China.
Nosso superávit fiscal de 3,5%, embora louvável, acaba se anulando pela impossibilidade de investi-lo internamente. Aliás, este resultado vira ficção econômica pois é obtido pela tributação excessiva que, por sua vez, inibi as exportações pela redução de competitividade. Ou pensam que lá fora, os importadores de produtos brasileiros querem comprar impostos brasileiros ? Só pelos nossos belos olhos ?
Na base destas insuficiências do setor público está a paquidermes estatal. O Brasil é dos paises que mais aplicam em prioridades sociais - 23% da arrecadação que já está alcançando absurdos 34% do PIB. Infelizmente, somente 20% desta receita tributária estão chegando ao atendimento na ponta. A maior parte fica pelo caminho e serve ao atendimento das corporações que, disfarçadas de boazinhas, fazem do assistencialismo seu ganha pão. É o Chapeuzinho Vermelho versão estatal.
Governo e iniciativa privada, pelo menos em termos econômicos, são vasos comunicantes. Pois fiquem sabendo que, tomando-se o PNL (ativos fixos + salários - impostos) o setor público representa 48% e o setor privado 52%. Enquanto isso, a divisão do PIB denuncia o desperdício governamental: 24% são produzidos pelo governo e contra 76% pela iniciativa privada, ou seja, cada dólar entregue ao governo volta pela metade. Em outras palavras, a produtividade do setor privado é 3 vezes maior do que a do setor público. Minha esperança era a de que, com as privatizações, essa relação se alteraria. Não é o que vejo. Mesmo porque a receita das privatizações ficou nas mãos do governo e, como era previsível, foi para o ralo do desperdício.
Nosso destino será traçado pela escolha das prioridades nacionais. Ou redefinimos as funções do estado e o confinamos às atividades que lhe são próprias e exclusivas, ou seja o que Deus quiser.