Obsessão
(Ossessione), de 1942, foi o primeiro longa de Luchino Visconti e está
completando 60 anos. O filme, considerado precursor do neo-realismo - iniciado
depois por Roberto Rosselini com Roma, Cidade Aberta - é baseado no livro de
James Cain e foi a segunda versão do seu conhecido O Destino Bate à Sua Porta
(The Postman Always Ring Twice) . A primeira foi a francesa Paixão Criminosa,
de 36, de Pierre Chenal e posteriormente a história teve mais duas versões: a
de 46, de Tay Garnett, com Lana Turner e a de 81 de Bob Rafelson - a mais
conhecida e que foi um sucesso de bilheteria - com Jessica Lange e Jack
Nicholson. Obsessão foi proibido pelo regime fascista porque mostrava a
desesperança e a miséria da vida provinciana na Itália. Por isso, e também
por problemas com direitos autorais, ele nunca foi lançado comercialmente no
Brasil, só tendo sido relançado nos Estados Unidos no início dos anos 70.
Realmente Visconti, que tinha pleno conhecimento das estruturas de classes da
Itália, procurara passar para os seus filmes seu engajamento político e sua
idéias marxistas. Sua origem, no entanto, era nobre, pertencente à família
que durante décadas exerceu o poder absoluto em Milão. Foi nessa cidade da
Lombardia que ele nasceu em 02.11.1906, filho do agente teatral Giuseppe
Visconti e de Carla Erba , a herdeira dos Laboratórios Erba. No início de sua
vida, só se interessava por corridas de cavalos. Mas no começo da década de
30 ele conheceu o grande diretor francês Jean Renoir , que o convidou para ser
seu assistente em vários filmes e despertou nele o interesse pelo cinema. De
volta à Itália, Visconti realizou Obsessão, dando o início real a uma
carreira brilhante no cinema e que também incluiu um grande envolvimento com a
produção teatral e de óperas. Montou e dirigiu tantos espetáculos
inesquecíveis para Maria Callas no Scala que a presença dos dois na grande
casa milanesa se tornou quase uma redundância . Um dos primeiros sucessos de
Visconti no Brasil foi Rocco e seus Irmãos, de 62, a história de uma família
de imigrantes do sul da Itália que passa por um doloroso processo de
desagregação tentando adaptar-se à vida na sofisticada Milão. O filme é
dividido em episódios e é considerado um dos grandes poemas trágicos do
cinema. No ano seguinte, em 63, Visconti realizou sua segunda obra prima seguida
: O Leopardo, Palma de Ouro no Festival de Cannes. O filme, com Burt Lancaster,
Alain Delon e Claudia Cardinale, retrata a decadência da nobreza italiana e sua
capacidade de adaptação aos novos tempos. Uma verdadeira aula de história e
de reconstituição política e sociológica do período da reunificação
italiana sob Garibaldi. Em 64, realizou Vagas Estrelas da Ursa Maior, no qual
deixa de tratar a família sobre o ponto de vista social para abordar temas
psicanalíticos ligados a problemas do inconsciente e a incestos. Embora o
público e a crítica tenham ficado divididos sobre este filme, ele permanece
até hoje como um clássico sobre o tema. Entre seus filmes mais conhecidos se
incluem ainda Deuses Malditos, Violência e Paixão e Boccacio 70 e sobretudo o
esplêndido Morte em Veneza, rodado em 71, com Dirk Bogarde, baseado no
clássico de Thomas Mann . Durante a filmagem de Ludwig, Visconti começou a ter
problemas de saúde agravados por desentendimentos e conflitos com os
produtores, que cortaram o filme para uma versão "comercial" de duas
horas. Só nos anos 80 seria lançada a cópia completa da obra, com quatro
horas de duração. Já com a saúde abalada, em cadeira de rodas, iniciou seu
último filme O Inocente, cuja montagem foi terminada por Ruggero Mastroianni,
devido à sua morte súbita em 17 de março de 76. Visconti partiu sem realizar
um dos seus maiores sonhos, o de levar para as telas Em Busca do Tempo Perdido,
de Marcel Proust. Deixou, no entanto, uma importante obra cinematográfica e é,
sem dúvida alguma, um dos grandes nomes da história do cinema.